Publicado em: 1 de março de 2025
Este boletim apresenta a importância dos museus como espaços de preservação e diálogo intercultural, com foco nas cerâmicas Kaingang e na participação dos povos indígenas na valorização de seu patrimônio cultural. Os museus se destacam por sua relevância social, sendo considerados locais privilegiados para o diálogo e a construção da memória, além de contribuírem para a formação das identidades coletiva e individual. Fabbri (2011) ressalta a necessidade de refletir sobre o papel dos museus no contexto atual, especialmente no que se refere à representatividade dessas instituições, com ênfase nas comunidades em que estão inseridas e no público a que se destinam.
A nova definição de museu, apresentada pelo Conselho Internacional de Museus (ICOM), suscita reflexões e amplia a percepção do público sobre a relevância dessas instituições para a sociedade, especialmente para as comunidades em seu entorno. “[…] Os museus funcionam e comunicam ética e profissionalmente e, com a participação das comunidades, proporcionam experiências diversas para educação, fruição, reflexão e partilha de conhecimento” (ICOM, 2022).
Por meio do programa de pesquisa, o Museu Índia Vanuíre desenvolve ações voltadas ao estudo de seu acervo institucional (MIV, 2022). As coleções da instituição possibilitam promover discussões tanto sobre o processo histórico do Oeste Paulista quanto sobre o diálogo com os povos indígenas da região, destacando seus saberes e perspectivas.
Dentre as metodologias de pesquisa empregadas, destacam-se aquelas voltadas para as coleções etnográficas que envolvem a participação indígena. O Museu desenvolve processos de construção conjunta e se abre para novas aprendizagens a partir da relação com os povos indígenas, reconhecendo-os como protagonistas nesses processos de pesquisa e compreendendo que esses objetos e saberes constituem um acervo vivo e dinâmico.
O Museu possui em seu acervo objetos do povo Kaingang, com destaque para as cerâmicas. Nesse contexto, a instituição realizou pesquisas com representantes Kaingang do Oeste Paulista: Dirce Jorge, Maria Rita Campos Rodrigues, Neusa Umbelino e José da Silva Barbosa de Campos (Zeca). Dirce relembra que aprendeu sobre a cerâmica de seu povo ainda na infância, com a ceramista Candire (Maria Cecília de Campos) e sua mãe, Jandira Umbelino Jorge. Maria Rita, por sua vez, relatou ter aprendido a cozinhar em panelas de cerâmica com sua mãe, Francisca Campos, que preparava comidas tradicionais do povo Kaingang, como iamĩ (bolo de milho) e pentfurõ (mingau de milho). Neusa ressaltou a importância da confecção de cerâmica para os Kaingang, enfatizando a necessidade de preservar e transmitir esse conhecimento às futuras gerações. Ela também relembrou sua mãe, Tereza Maria Leri, que usava a cerâmica para armazenar o iamĩ. Zeca compartilhou memórias afetivas sobre sua avó, Maria Cecília de Campos (Candire), e sua mãe, Ena Luiza de Campos, destacando o valor da transmissão desses saberes entre as gerações.
Cada detentor do saber compartilhou histórias pessoais e vivências culturais que expressam o vínculo afetivo com as cerâmicas, ressignificando esses objetos e atribuindo-lhes novos sentidos. Carregadas de afeto e memória, essas peças enriquecem a compreensão do acervo e aprofundam a relação entre o Museu e os povos indígenas, fortalecendo o compromisso da instituição com práticas inclusivas e respeitosas. Por meio do diálogo contínuo, o Museu busca ampliar a participação e o protagonismo das comunidades indígenas na construção e na valorização dos saberes preservados em seu acervo.
Referências
CONSELHO INTERNACIONAL DE MUSEUS – ICOM. ICOM aprova Nova Definição de Museu. Disponível em: https://www.icom.org.br/?p=2756#:~:text=Os%20museus%2C%20abertos%20ao%20p%C3%BAblicoreflex%C3%A3o%20e%20partilha%20de%20conhecimento%E2%80%9D. Acesso em: 10 fev. 2025.
FABBRI, Angelica. Museus: o que são, para que servem. In: Museus: o que são, para que servem? Sistema Estadual de Museus – SISEM SP (Organizador) Brodowski (SP): ACAM Portinari; Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo. São Paulo, 2011. (Coleção Museu Aberto) 131 p.
MUSEU HISTÓRICO E PEDAGÓGICO ÍNDIA VANUÍRE. Plano Museológico. Brodowski: ACAM Portinari, 2018 (rev. 2022).